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segunda-feira, 24 de outubro de 2016

Opinião




OITENTA ANOS SÃO PASSADOS


Na primeira página da edição do dia 22 de Out., do DN local, lê-se: “Prédio da ILMA “reverte” para os trabalhadores”. O fecho daquela unidade foi a sentença de morte num projecto para a Madeira. 

Dia 20, 5ª feira, perfizeram-se oitenta anos sobre a passagem do navio Luanda pelo Funchal para embarcar, na sequência da revolta do leite, 52 presos da PVDE (antecessora da PIDE), com destino a Cabo Verde. Colhiam-se as tempestades dos ventos semeados durante o tempo de Liberdade vivido entre 1910 e 1926. As elites de então, digladiando-se em retóricas parlamentares, deixaram degenerar a vida colectiva. Teixeira Gomes, em 1925, num jantar em Belém, falando para políticos e militares avisava:«enquanto certos políticos da nossa terra teimarem em pensar com o estomago e digerirem com os miolos, isto não tem concerto possível. E o pior é que já é muito tarde para tê-lo, porque quer os senhores queiram, quer não isto (acentuou, voltando-se à direita para o General Carmona e tocando-lhe nos galões) vai-lhes  directamente parar às mãos». Ele anunciava a Ditadura que surgiria meses depois. Num País instabilizado e inserido num Mundo conturbado, a vida colectiva deteriorara-se e urgia disciplinar o País. As liberdades foram cerceadas, mas os projectos em nome dos quais se haviam sacrificado as populações, resistiriam no tempo. 

A Madeira, na década de 30, conheceu três revoluções. Em 1939 surge o pesadelo da 2ª guerra, tornando ainda mais difíceis as condições de vida das populações. O Governador Civil de então dizia: “a fome é sempre má conselheira e uma ameaça à ordem pública”. Fiel às suas palavras, fez distribuir, gratuitamente, milho a desempregados. A ordem pública de então, hoje disciplina cívica, deve preocupar quem manda. O Turismo foi altamente penalizado, até pela redução dos barcos que nos visitavam. Só melhorou quando se ocuparam hotéis e outras residências com pessoas evacuadas de prováveis zonas de conflito, como Gibraltar. Predominava no grupo a juventude feminina - as “gibraltinas” - que revolucionaram os costumes da Madeira! O dinheiro derramado por estas pessoas teve um efeito positivo numa economia onde ele escasseava. A Madeira, ao contrário do Continente, não beneficiou do dinheiro da venda de volfrâmio aos Países beligerantes! 

Finda a 2ª guerra, o Estado Novo, durante 29 anos, (treze dos quais em guerra em três frentes africanas, não discuto se bem ou mal. Tenho opinião sobre isso, mas não vem ao caso agora) prosseguiu aquilo a que ele chamava a “valorização dos recursos locais”. O dinheiro - esse malvado – era escasso e criteriosamente repartido. Lembro-me que, na Guiné, “apertadinhos” com a girandola que vinda da mata nos caía em cima, gastámos mais granadas de obus do que aquelas que a parcimónia mandava. Não escapei ao reparo da hierarquia, ainda que muito leve. Obedecendo a estas regras, com sérias limitações de dinheiro, valorizavam os recursos dentro de um Plano, com Objectivos claramente expostos. Queriam turismo de qualidade. Cumpriram. Por isso deixaram o Madeira Palácio, o Sheraton, e a Matur. Seguiram, com algum atraso, as obras da captação de água para o regadio e abastecimento público. A pequena indústria agro-alimentar, que tanto fizera sofrer os madeirenses, também foi contemplada com legislação que a adaptaria às novas realidades. 

Com a implantação da Constituição de 1976, a Madeira ganhou a capacidade de gerir os seus recursos. A escassez de dinheiro acabou. Recorrendo, de início, à chantagem, juntando-se-lhe depois as ajudas Europeias e o crédito bancário, a abundância de dinheiro foi uma realidade até ao estoiro final. A conciliação do turismo de qualidade – herança do passado – com a produção agrícola criadora de riqueza implicava cautela, pois, vendendo o turismo paisagem, ela devia ser uma prioridade. Embriagados pelo dinheiro abundante, ganhar eleições foi objectivo único. A Europa afogou-nos em dinheiro! Faltou-nos “prudência e tino”, a Suíça é montanhosa e tem vacas, bem ao contrário daquilo que afirmava a propaganda – o acidentado da ilha impossibilitaria a criação de gado – na qual se escondeu um enorme falta de vontade política para agir. A água escassa, passou a ter como prioridade o turismo e a propaganda tudo isto escond(eu)ia. A subsistência das populações rurais ainda não está em perigo, mas o abandono a que votaram a formação dos preços dos bens agrícolas regionais reflecte-se num Mercado dos Lavradores vazio, acelerando a diabolização da produção regional. 

Qual o projecto de futuro que têm as nossas elites, apenas subordinadas à retórica “eleiçoeira” da 1ª República? Ao cair, o Estado Novo, deixou futuro. Face a esta realidade apetece reproduzir de Teixeira Gomes: «enquanto certos políticos da nossa terra teimarem em pensar com o estomago e digerirem com os miolos, isto não tem concerto possível.» Será o fim da Autonomia.

GAUDÊNCIO FIGUEIRA

9 comentários:

Anónimo disse...

http://www.lusopt.pt/portugal/168-a-verdade-escondida-sobre-cavaco-silva.html

Anónimo disse...

«Isto não tem conserto possível». De resto, apoiado, Dr. Gaudêncio.

Anónimo disse...


Alguém consegue explicar as demissões no JPP ?

Anónimo disse...

O desconcerto começou há muito tempo...desde o jardinismo com os que o apoiaram

Fernando Vouga disse...

No seguimento do 25 de Abril de 74, a Madeira teve uma oportunidade única de alcançar a autonomia com dignidade e lisura de procedimentos. Mas, quem passou a mandar, preferiu a arrogância, a prepotência, a irresponsabilidade e a batota política. O resultado está à vista: cimento e mais cimento e dívidas faraónicas.

j disse...

Duas razões trouxeram-me a este comentário.
1 - Quebrar uma norma que me levava a ignorar comentários anónimos. Fui demasiado maltratado por anónimos, daí a minha opção.
Não foi o caso de hoje. O humor do anónimo das 10:55 com o "conserto" fez-me rir. Estou a ser sincero. Trata-se de erro nada simpático, mas do qual ninguém está livre. Eu copiei aquele texto, como pode verificar pelas aspas, de um lado qualquer que me mereceu confiança. Porém, não era um original de 1925. Deveria eu corrigir? Optei por publicar como encontrara.
2 - O Fernando em quatro linhas resumiu quarenta anos de muito pouco tino. Tino, se algum houve, foi igual ao do grande animador de Congressos no tempo Guterres e candidato a PR mais tarde

Anónimo disse...

Coronel Vouga,

Permita-me uma correção.
Depois do 25 de abril, ainda houve na Madeira pessoas que quiseram criar uma autonomia com dignidade e com responsabilidade.
Conheci várias dessas pessoas, gente de bem, com honra, sentido do dever e seriedade.
Mas foram ultrapassadas e/ou afastaram-se quando perceberam um poder que se instalava e que se movia por interesses, pessoais e económicos.

Fernando Vouga disse...

Caro comentados das 10:13

Claro que tem razão. O que agrava a culpa de quem assaltou o poder.

Jorge Figueira disse...

Estes 40 anos foram obra de opositores aos militares de má memória que queriam enganar o Povo no 25 de Abril.
Haverá dentre estes actuais "servidores do Bem Comum", com a barriga encostada à mesa do orçamento durante 40 anos, alguém capaz de abdicar de uma das mordomias com que, a prazo, se locupletaram? Legislaram, em benefício próprio, no tempo em que ninguém queria saber de contas e o Zé Pagode, só há pouco acordou para o Jackpot!
Os militares, e o País, tiveram no Gen. Eanes alguém que, para evitar mais crispação nas ruas, promulgou uma Lei, emanada da AR que lhe retirou ao vencimento uma verba considerável. O Tribunal mais tarde veio reconhecer-lhe o direito à remuneração. Ramalho Eanes, porem, não recebeu.
Vislumbram alguém capaz de fazer uma coisa destas nas elites que nos governam?
É a isto que Teixeira Gomes se refere...não há "concerto"